Educação e o papel da crítica


Fonte: emfocoweb.worpress.com
Acesso: 15/06/2020


A educação é ligada diretamente ao processo de desenvolvimento humano. Se analisarmos a história, a escola, surge no contexto das sociedades de classes e como um privilégio da elite. Nessa esteira a educação para o povo acontece nos limites da formação de mão de obra e da difusão dos valores dominantes, conforme os interesses dos donos dos meios de produção, a classe dominante. Porém, como um espaço de enfrentamento, reflete as relações de conflito entre dominantes e dominados e a busca dos trabalhadores contra a opressão e a exploração.

A crítica deve ser feita à educação burguesa, como prática e como ideologia e ou concepção de mundo. O objetivo é ir ao encontro de uma educação que supere as práticas educacionais predominantes. Ao longo da história e principalmente no capitalismo, os temas que foram levantados, destacam-se: as condições de trabalho e de instrução das crianças trabalhadoras do século XIX (período de consolidação do capitalismo); o papel do Estado na educação; o princípio da união entre escola e trabalho; ideais das revoluções burguesas , como ensino universal, público, gratuito e obrigatório; a laicidade do ensino e a escola pública.

No Brasil, com o avanço do capitalismo, principalmente no final do século XIX e início do século XX, perpassando o novo milênio, se estabelece: a necessidade de formação dos trabalhadores e trabalhadoras nas questões de introdução dos valores da ordem burguesa, à inclusão dos conhecimentos básicos para a participação na vida da cidade, à formação da mão de obra industrial. (Saviani, Nereide. 2011).

Conforme Saviani, Nereide: Tais objetivos, colocados pela burguesia, imbuíam-se, inicialmente, da preocupação com a normatização do ensino (organização em níveis, estabelecimento de regras para passagem de um a outro), sob o controle do Estado. Surge, com o tempo, a ideia de escola única (articulação de ramos e modalidades de ensino), organizada num sistema nacional de educação. [...]

Nessa mesma linha o estado enquanto instituição de representação de uma classe, a dominante, através de seus governos: municipais,estaduais e federal aprofunda as diferenças.

Seguindo a afirmação de Saviani, Nereide: […] Com a consolidação do capitalismo, a burguesia, já conservadora, recompõe seu discurso, na defesa da escola única, mas diferenciada, num sistema dual, isto é: composto de uma base comum, para todos; bifurcando-se em caminhos diversificados, de acordo com as potencialidades dos educandos para, de um lado, prosseguir rumo à formação de nível superior (no âmbito das ciências, das humanidades, das artes, da literatura) e, de outro, voltando-se para a capacitação técnica, as atividades industriais, agrícolas, comerciais que exigiriam, quando muito, estudos de nível médio. [...]

Dois tipos de escola, a primeira para formar a elite dirigente, a segunda, apenas tratando da formação de mão de obra e do cumprimento das regras de escolha dos representantes dessa elite. Mesmo assim, a ideia de universalização da educação transformou-se em bandeira de forças políticas ligadas aos interesses populares: a reivindicação de uma mesma escola para todos, que viria a ser a escola única do trabalho. É fundamental considerar as diferenças culturais, étnicas, de gênero nesse cenário, elas fazem parte da nossa realidade, mas não podem se estabelecer para reproduzir as desigualdades sociais (Saviani). A classe dominante tira proveito dessas diferenças para exercer a dominação.

A situação atual da escola, essa crise que se acirra com a pandemia do COVID-19, toda essa realidade imposta pelas medidas necessárias de combate à transmissão do Corona Vírus, não é a única responsável pelos sérios problemas apresentados na educação. Se considerarmos a educação no Rio Grande do Sul, as mazelas sofridas durante anos e nos últimos se aprofundam com o sucateamento das escolas, com o parcelamento dos salários dos docentes e com o total desinteresse por parte dos dois últimos governadores.

A agonia da educação, o terror enfrentado pelas escolas públicas demonstra o acirramento da divisão de uma escola para a elite e outra para os trabalhadores, para quem de fato constrói a riqueza de uma nação com o seu trabalho. O centro da crise atual da escola e da crise da sociedade capitalista, é cada vez mais a divisão social do trabalho. Essa divisão que acontece a partir da apropriação privada dos produtos da ciência, da tecnologia. A separação entre a escola e o mundo do trabalho, entre a ciência e a produção aprofunda ainda mais a caótica situação. Se pensarmos na Escola e nas diferenças de classes, concluímos que não é a escola quem as cria e não tem o poder de eliminá-las.

Para atingirmos esse patamar é necessário a ação consciente do povo. É necessário buscarmos uma Escola, na sua essência, democrática e, que não dê espaço aos interesses somente de uma classe dominante, e sim em um espaço de compreensão de educação numa visão sem a lógica da exploração, mas que necessita ser construída ainda em uma sociedade de classes, compreendendo o papel dos trabalhadores e dos filhos desses enquanto artífices da realidade.

Prof. Saulo Velasco

Historiador

Especialista em Metodologia do Ensino de Filosofia e Sociologia

Professor da Rede Municipal de Ensino de Caxias do Sul



Referências


GRAMSCI, Antonio. Os intelectuais e a organização da cultura. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1968.


MACHADO, Lucília Regina S. Politecnia, Escola Unitária e Trabalho. São Paulo: Cortez/Autores Associados, 1989.

_____________. Concepção de escola, de escola unitária e de politecnia. Transcrição de exposição em mesa redonda, em seminário da Corrente Sindical Classista. São Paulo, 2003.


SAVIANI, Dermeval. Pedagogia Histórico-Crítica. Campinas, Autores Associados, 8ª ed., 2003.


SAVIANI, Nereide. Doutora em educação pela PUC-SP. Diretora de Formação da Fundação Maurício Grabois.


VYOTSKY, Lev Semanovich. A Formação Social da Mente. São Paulo: Martins Fontes, 1984.



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