O papel da escola na Educação Crítica em tempo de Pandemia

O papel da escola na Educação Crítica em tempo de Pandemia


Inicio o texto trazendo a tona sobre quais são, dois pontos fundamentais da educação, ressalto, não são os únicos, portanto indispensáveis. Conforme Araújo: os dois eixos indissociáveis em torno das quais giram ou deveriam girar, as proposta educacionais: a instrução e a formação ética, dos futuros cidadãos e cidadãs.

O primeiro eixo apresentado por Araújo, a instrução, refere-se aos conhecimentos que foram desenvolvidos ao longo da história pela humanidade e que os povos transmitem às futuras gerações, está diretamente ligado a escola, seja ela de caráter tradicional/conservadora ou transformadora. A escola amplia a perspectiva histórico-cultural da educação.

O segundo eixo que trata da formação ética é um tanto controverso, já que a Ética é formada pela concepção do modo de produção vigente, então a ética capitalista não é e não deve ser a ética do trabalhador. Ética é um elemento classista, a controversa situa-se na elaboração dos currículos que privilegiam a cultura e os conhecimentos que servem aos interesses da classe dominante. A educação é um fenômeno próprio dos humanos. Conforme Velasco, a educação é fundamental para o trabalho e ao mesmo tempo ela é um processo de trabalho.

[…] Para garantir a existência da humanidade necessita-se da garantia de subsistência, com a produção, com o trabalho material. Para produzir é necessário antecipar, planejar em ideias os objetivos da ação prática. Para concretizar estas ações, precisa-se do conhecimento, da produção de ideias, conceitos, símbolos, valores, habilidades e atitudes. A produção do saber, a apropriação da evolução do conhecimento humano. […] VELASCO, Saulo Rodrigo Bastos. Política e Educação: Dois conceitos da mesma realidade. In: Educação para a Democracia. Organizadores: SILVA, Otávio Henrique & DINIZ, Marina Murph, pg. 27.

A educação não se reduz tão somente ao ensino formal, ela se relaciona com o trabalho e ao desenvolvimento da sociedade. A institucionalização do pedagógico através da escola é uma das partes específicas da educação. Conforme Saviani, a escola é uma instituição cujo papel consiste na socialização do saber sistematizado. O saber sistematizado não se trata de qualquer tipo de saber. Na escola trata-se do conhecimento elaborado, em contrapartida ao conhecimento espontâneo. A escola é o terreno do saber sistematizado e não do saber fragmentado.

Segundo Saviani, é a exigência de apropriação do conhecimento sistematizado por parte das novas gerações que torna necessária a existência da escola. Para superar a escola tradicional, de manutenção do status quo a escola deverá ser uma instituição destinada a buscar um novo tipo de sociedade, colaborar para a destruição do atual modo de produção e apoiar a transição de um novo modo produtivo. A escola crítica é um instrumento de substituição do pensamento estanque para um pensamento libertador articulado com ações de transformação social.

Em relação a Ética, Araújo entende que formar o sujeito ético competente para agir nesta sociedade e participar de sua vida política e de sua vida pública não se dá somente trabalhando os direitos e deveres, como propõe a maioria dos autores que lidam com esse tema. O Educar em valores, tão em voga atualmente, não deve se ater-se somente na construção de regras, de estudo dos direitos e deveres, do pensamento no que se diz certo ou errado.

A Ética, mesmo que seja de um contexto social e relacionada a um modo de produção vigente, deve estar ligada a competências que vão além do cumprimento de regras das instituições sociais. A escola tem o dever moral de apresentar ao estudantes os tipos de éticas vigentes nas classes sociais do sistema atual, nesse caso não existe apenas um ética, por exemplo, no modo de produção capitalista se considera ético o trabalhador receber um salário de fome que não garante as suas necessidades básicas, sendo assim o trabalhador tem o direito e o dever ético de organizar-se de forma coletiva para reivindicar melhores salários e condições de trabalho e ir além, ou seja, atuar no seu sindicato de representação, contribuindo também para a disputa do poder político por parte de seus representantes e sim defender partidos que de fato atuam em prol da classe trabalhadora na busca desse poder.

A atual realidade sobre a educação em tempo de pandemia nos apresenta um problema sério a ser resolvido, seja na questão pedagógica, seja na questão ética. A desigualdade histórica do Brasil se aprofunda ainda mais com a pandemia,as injustiças continuam gritantes. Não estamos apenas passando por uma crise sanitária sem precedentes e uma crise econômica caótica. A educação vem sofrendo os problemas mais gritantes.

O Brasil um país que já foi a 6ª economia mundial, amarga o índice onde 48% da população pobre não tem acesso a rede mundial de computadores (internet), infelizmente não terá êxito o estudo à distância e o trabalho remoto nas escolas públicas. Uma proposta ilusória e totalmente desconectada com a realidade. As escolas da rede municipal estão na base da pirâmide nesse ranking. As famílias amargam dificuldades para manter o sustento, como conseguirão pagar internet ou ter condições para comprar um celular ou computador para seus filhos para garantir os estudos? Qual a saída?

Se os governos não garantirem uma plataforma para as aulas remotas e disponibilizar pacotes de dados gratuitos para todos os estudantes, ou seja, internet gratuita, não existirá o acesso universal ao chamado ensino remoto. Além desse problema crucial tem o risco de voltar as aulas em setembro com os ditos protocolos sanitários e mantermos o risco de contaminação, transformando a situação em um caos maior.

De nada adianta os estudantes adquirirem conhecimento e estudarem sobre a Ética sem terem suas vidas garantidas, de nada adianta conhecer e não praticar o conhecimento através do entendimento da realidade e da sua situação social com perspectiva de transformação.

A solução imediata e urgente é cancelar o ano letivo em 2020 e construir uma proposta de recuperação em 2021, focar em dois elementos de estudo até lá, o aperfeiçoamento das habilidades de leitura e interpretação em todas os componentes curriculares, utilizar os livros que os estudantes já têm e propor outros textos, distribuir de forma planejada a cada quinze dias com esse único objetivo.

Uma solução simples, mas não simplista, com a máxima de que: “Ano letivo se recupera, vidas não”!


Prof. Saulo Rodrigo Bastos Velasco

Historiador

Especialista em Metodologia do Ensino de Filosofia e Sociologia


Referências Bibliográficas

ARAÚJO, Ulisses F. Temas transversais e a estratégia de projetos. São Paulo. Moderna. 2004.

SAVIANI, Demerval. Pedagogia Histórico-Crítica. Campinas. Autores Associados, 8ª ed. 2003.

VELASCO, Saulo Rodrigo Bastos. Política e Educação: Dois conceitos da mesma realidade. In: Educação para a Democracia. Organizadores: SILVA, Otávio Henrique & DINIZ, Marina Murph. Editora LiberArs. São Paulo. 2018.


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