Crise Internacional
11 DE NOVEMBRO DE 2008
Contra a crise, economistas defendem distribuição de renda
Companheiros do Brasil no Bric, grupo que reúne as maiores economias emergentes, Rússia, Índia e China têm as atenções mundiais voltadas ao desempenho de suas economias nesse período de crise financeira global. A análise da situação desses três países por economistas locais foi um dos pontos altos do simpósio internacional “Perspectivas para o Desenvolvimento no Século 21”, organizado pelo Centro Internacional Celso Furtado e realizado nos dias 6 e 7 de novembro no Rio de Janeiro.
Professor da Escola de Estudos Orientais e Africanos da Universidade de Londres, o chinês Dic Lo afirmou que a atual crise servirá para que seu país resolva o paradoxo constituído pelas graduais transformações econômicas iniciadas há três décadas sob o comando da direção do Partido Comunista Chinês: “Existe uma pressão para a China aderir ao Consenso de Washington, como se esse fosse um caminho natural para o seu crescimento econômico. Por outro lado, a corrente anti-globalização defende as reformas capitalistas, mas não admite que a China assuma uma política neoliberal, no que se refere à desigualdade social e a má distribuição de renda”, disse.
Lo propõe uma alternativa, que é “trabalhar com o mercado, mas adotar políticas sociais para corrigir os excessos”. O governo chinês, segundo o economista, demonstra ter essa percepção: “Houve preocupação em aliar o crescimento econômico com políticas de proteção ao trabalho e um forte processo de sindicalização”, disse. Frente à crise atual, Lo acredita que a China vá se portar como na crise asiática, iniciada em 1999: “Na ocasião, o governo chinês aumentou seus gastos com investimentos e optou pela expansão do PIB”.
Um fator específico que, segundo Lo, dá segurança à China em momentos de crise financeira é o fortalecimento de sua economia doméstica: “A distribuição igualitária da renda foi fundamental para alavancar o consumo de massas e fortalecer a economia doméstica nesses anos de crescimento acelerado. Houve uma revolução de consumo da população chinesa como um todo”, disse.
O recente e fantástico crescimento da China, na explicação do economista, conhece duas etapas. Na primeira, que durou do fim dos anos oitenta até 1995, o governo investiu maciçamente no crescimento da indústria pesada, o que provocou a transformação da mão-de-obra agrícola em mão-de-obra industrial e ocasionou uma grande migração da população rural para as cidades.
A segunda fase, que dura até hoje, marca a gradual abertura da China para o capital externo e o mercado financeiro: “A liberalização, acentuada a partir de 2000, já trouxe conseqüências macroeconômicas sérias, como a demissão de 65 milhões de trabalhadores das empresas estatais ou coletivas”, afirma Lo. A atual crise, espera o economista, servirá para enfraquecer o setor da elite política chinesa que defende uma maior adesão ao Consenso de Washington: “A crise mostrou a todos que o aumento das atividades ligadas à especulação não pode continuar”.
China sobe, Rússia desce
Ao contrário de um governo comunista que se abre gradualmente ao capitalismo, o caso da Rússia é exemplo de uma abertura radical realizada em poucos anos, fato que faz com que a situação atual do país seja bem diferente da situação chinesa. Essa demonstração foi feita pelo economista russo Vladimir Popov, que é professor da Nova Escola Econômica de Moscou: “China e Vietnã fizeram reformas que não trouxeram redução da economia. Na Rússia, e nos países do Leste Europeu, ocorreu o oposto”, disse.
Segundo Popov, até hoje o PIB russo se encontra abaixo dos níveis registrados em 1989, ano da queda do regime comunista. O estresse social causado pelo desmantelamento do estado soviético e a apropriação do aparato bélico e industrial russo por uma nova elite dirigente, segundo o economista, está na origem da crise que só permitiu à Rússia voltar a crescer continuamente a partir de 1998. O problema da desigualdade, no entanto, ainda é o mais grave do país na opinião de Popov: “Segundo a revista Forbes, existem 500 bilionários na Rússia. Na Alemanha foram identificados 50”, disse.
Popov afirmou que o sucesso chinês se deve à herança maoísta, que concentrou nas mãos do Estado o sistema bancário, a posse das terras e o acúmulo de reservas: “Por isso, ao contrário da Rússia, a liberalização econômica teve efeito positivo quando chegou à China”, disse. O economista russo afirmou que o atual sucesso da economia chinesa pode servir de inspiração na busca de soluções para a economia global: “O importante do crescimento chinês é que, pela primeira vez, de verdade, um país conseguiu vencer o atraso econômico sem adotar o modelo ortodoxo neoliberal”.
A pobre Índia rica
Colônia britânica até 1950 e país democrático e capitalista desde então, a Índia é um caso a parte, como demonstrou o economista indiano Rayaprolu Nagaraj, que é professor do Instituto Indira Gandhi de Pesquisa sobre o Desenvolvimento. O país ocupa atualmente o 12º lugar no ranking das maiores economias do mundo, mas ainda enfrenta o desafio de promover a distribuição de renda e combater a extrema pobreza que assola parte de sua enorme população, sobretudo os 56% que vivem no meio rural.
A atual posição de força da economia indiana, segundo Nagaraj, se explica pelo fortalecimento do mercado doméstico: “Durante décadas, o crescimento econômico do país não dependeu de poupança externa ou de fluxos financeiros privados internacionais”, disse. Em um primeiro período, que durou até a década de 1980, a Índia cresceu e conseguiu reduzir a pobreza absoluta. A partir da década seguinte, com o aceleramento das reformas e a adesão ao Consenso de Washington, a coisa se modificou: “As reformas fizeram a Índia crescer ainda mais, mas tiveram impacto negativo na redução da pobreza”, disse o economista.
Nagaraj aponta como grandes desafios para a Índia aprofundar a democracia e diminuir a desigualdade social. Algumas medidas já vem sendo tomadas pelo governo indiano, como a adoção de políticas de inclusão positiva e do sistema de cotas nos postos de trabalho e no ensino superior para os membros das castas mais baixas, como os dalits (intocáveis), que representam 15% da população. A crise atual, segundo Nagaraj, também pode servir como momento de reflexão para o governo indiano: “A Índia está numa encruzilhada: ou segue a ortodoxia de Washington ou aprofunda as políticas de investimento interno e combate à pobreza e à desigualdade social”.
Fonte: Agência Carta Maior
Contra a crise, economistas defendem distribuição de renda
Companheiros do Brasil no Bric, grupo que reúne as maiores economias emergentes, Rússia, Índia e China têm as atenções mundiais voltadas ao desempenho de suas economias nesse período de crise financeira global. A análise da situação desses três países por economistas locais foi um dos pontos altos do simpósio internacional “Perspectivas para o Desenvolvimento no Século 21”, organizado pelo Centro Internacional Celso Furtado e realizado nos dias 6 e 7 de novembro no Rio de Janeiro.
Professor da Escola de Estudos Orientais e Africanos da Universidade de Londres, o chinês Dic Lo afirmou que a atual crise servirá para que seu país resolva o paradoxo constituído pelas graduais transformações econômicas iniciadas há três décadas sob o comando da direção do Partido Comunista Chinês: “Existe uma pressão para a China aderir ao Consenso de Washington, como se esse fosse um caminho natural para o seu crescimento econômico. Por outro lado, a corrente anti-globalização defende as reformas capitalistas, mas não admite que a China assuma uma política neoliberal, no que se refere à desigualdade social e a má distribuição de renda”, disse.
Lo propõe uma alternativa, que é “trabalhar com o mercado, mas adotar políticas sociais para corrigir os excessos”. O governo chinês, segundo o economista, demonstra ter essa percepção: “Houve preocupação em aliar o crescimento econômico com políticas de proteção ao trabalho e um forte processo de sindicalização”, disse. Frente à crise atual, Lo acredita que a China vá se portar como na crise asiática, iniciada em 1999: “Na ocasião, o governo chinês aumentou seus gastos com investimentos e optou pela expansão do PIB”.
Um fator específico que, segundo Lo, dá segurança à China em momentos de crise financeira é o fortalecimento de sua economia doméstica: “A distribuição igualitária da renda foi fundamental para alavancar o consumo de massas e fortalecer a economia doméstica nesses anos de crescimento acelerado. Houve uma revolução de consumo da população chinesa como um todo”, disse.
O recente e fantástico crescimento da China, na explicação do economista, conhece duas etapas. Na primeira, que durou do fim dos anos oitenta até 1995, o governo investiu maciçamente no crescimento da indústria pesada, o que provocou a transformação da mão-de-obra agrícola em mão-de-obra industrial e ocasionou uma grande migração da população rural para as cidades.
A segunda fase, que dura até hoje, marca a gradual abertura da China para o capital externo e o mercado financeiro: “A liberalização, acentuada a partir de 2000, já trouxe conseqüências macroeconômicas sérias, como a demissão de 65 milhões de trabalhadores das empresas estatais ou coletivas”, afirma Lo. A atual crise, espera o economista, servirá para enfraquecer o setor da elite política chinesa que defende uma maior adesão ao Consenso de Washington: “A crise mostrou a todos que o aumento das atividades ligadas à especulação não pode continuar”.
China sobe, Rússia desce
Ao contrário de um governo comunista que se abre gradualmente ao capitalismo, o caso da Rússia é exemplo de uma abertura radical realizada em poucos anos, fato que faz com que a situação atual do país seja bem diferente da situação chinesa. Essa demonstração foi feita pelo economista russo Vladimir Popov, que é professor da Nova Escola Econômica de Moscou: “China e Vietnã fizeram reformas que não trouxeram redução da economia. Na Rússia, e nos países do Leste Europeu, ocorreu o oposto”, disse.
Segundo Popov, até hoje o PIB russo se encontra abaixo dos níveis registrados em 1989, ano da queda do regime comunista. O estresse social causado pelo desmantelamento do estado soviético e a apropriação do aparato bélico e industrial russo por uma nova elite dirigente, segundo o economista, está na origem da crise que só permitiu à Rússia voltar a crescer continuamente a partir de 1998. O problema da desigualdade, no entanto, ainda é o mais grave do país na opinião de Popov: “Segundo a revista Forbes, existem 500 bilionários na Rússia. Na Alemanha foram identificados 50”, disse.
Popov afirmou que o sucesso chinês se deve à herança maoísta, que concentrou nas mãos do Estado o sistema bancário, a posse das terras e o acúmulo de reservas: “Por isso, ao contrário da Rússia, a liberalização econômica teve efeito positivo quando chegou à China”, disse. O economista russo afirmou que o atual sucesso da economia chinesa pode servir de inspiração na busca de soluções para a economia global: “O importante do crescimento chinês é que, pela primeira vez, de verdade, um país conseguiu vencer o atraso econômico sem adotar o modelo ortodoxo neoliberal”.
A pobre Índia rica
Colônia britânica até 1950 e país democrático e capitalista desde então, a Índia é um caso a parte, como demonstrou o economista indiano Rayaprolu Nagaraj, que é professor do Instituto Indira Gandhi de Pesquisa sobre o Desenvolvimento. O país ocupa atualmente o 12º lugar no ranking das maiores economias do mundo, mas ainda enfrenta o desafio de promover a distribuição de renda e combater a extrema pobreza que assola parte de sua enorme população, sobretudo os 56% que vivem no meio rural.
A atual posição de força da economia indiana, segundo Nagaraj, se explica pelo fortalecimento do mercado doméstico: “Durante décadas, o crescimento econômico do país não dependeu de poupança externa ou de fluxos financeiros privados internacionais”, disse. Em um primeiro período, que durou até a década de 1980, a Índia cresceu e conseguiu reduzir a pobreza absoluta. A partir da década seguinte, com o aceleramento das reformas e a adesão ao Consenso de Washington, a coisa se modificou: “As reformas fizeram a Índia crescer ainda mais, mas tiveram impacto negativo na redução da pobreza”, disse o economista.
Nagaraj aponta como grandes desafios para a Índia aprofundar a democracia e diminuir a desigualdade social. Algumas medidas já vem sendo tomadas pelo governo indiano, como a adoção de políticas de inclusão positiva e do sistema de cotas nos postos de trabalho e no ensino superior para os membros das castas mais baixas, como os dalits (intocáveis), que representam 15% da população. A crise atual, segundo Nagaraj, também pode servir como momento de reflexão para o governo indiano: “A Índia está numa encruzilhada: ou segue a ortodoxia de Washington ou aprofunda as políticas de investimento interno e combate à pobreza e à desigualdade social”.
Fonte: Agência Carta Maior
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